O que esperar da SPFW com “quiet luxury” à brasileira
Written by on 21 de maio de 2023
Marina Bitu e David Lee, duas marcas que estreiam
na próxima edição da São Paulo Fashion Week, são representantes da versão
brasileira do “quiet luxury”, o luxo silencioso. Ou pelo menos é
assim que Graça Cabral, uma das comandantes da semana de moda, define a versão
local do grande tema fashion do ano.
“Quiet luxury” é a moda de usar roupas de
grife em tons neutros e sem ostentar logos, como uma camiseta branca lisa da
Prada ou uma calça preta Tom Ford, por exemplo –em outras palavras, um visual
básico que custa milhares de reais.
“Nosso ‘quiet luxury’ são os nichos, pequenas
marcas que vão trabalhar moda autoral numa escala muito menor. Assim as peças
podem ter uma ousadia, não precisam ter uma única cor ou cartela de
cores”, ela diz, ao ser referir à uniformização das roupas proposta por
grandes grifes de luxo, com produção em escala global e preços muito caros,
inacessíveis para a maioria.
As duas marcas, ambas do Ceará e que levam os nomes
de seus diretores criativos, desfilam na edição de número 55 da São Paulo
Fashion Week. Bitu produz vestidos, tops e saias femininas sob demanda
explorando rendas e bordados a partir de tecidos que seriam descartados. Lee
junta a alfaiataria e o sportwear em sua linha masculina, também inspirada pela
pegada utilitária das roupas militares.
Principal evento de moda do país, a São Paulo
Fashion Week vai ocupar diferentes locais da capital paulista entre 22 e 28 de
maio. A estação terá 31 desfiles presenciais e 11 coleções mostradas em vídeos
-exibidos em sessão única de cinema-, totalizando pouco menos do que os 48
participantes da edição anterior.
Além de Bitu e Lee, outras cinco marcas vão
desfilar pela primeira vez -Forca Studio, Foz, Gefferson Vila Nova, Rafael
Caetano e The Paradise. Por outro lado, esta edição da semana de moda não conta
com algumas grifes grandes, como Ellus, ou outras que têm apresentações com
lugares disputados, caso da Misci.
Paulo Borges, o fundador e diretor criativo do
evento, afirma que é normal algumas marcas, sobretudo as de tamanho médio,
mostrarem somente uma coleção por ano, porque é muito caro preparar um desfile.
A Ellus disse apenas que optou por não participar, e a Misci informou que a
data da SPFW neste semestre não bate com seu calendário de lançamento.
Ausências à parte, um dos ingressos mais quentes
desta edição é o do desfile de João Pimenta, que abre a temporada com uma
apresentação no palco do Theatro Municipal, celebrando os 20 anos de sua marca.
E de palco o estilista entende, dado que ele já ganhou cinco prêmios por
figurinos que desenhou para peças de teatro e foi indicado para outros seis.
O público vai ver peças inspiradas nas três figuras
que nortearam as duas décadas de costura de Pimenta -o dândi, o punk e o
caubói. “Eu sempre achei que o figurino era um problema para mim, que me
deixava menos estilista, mas agora não. Fazer um desfile olhando para a minha
história é uma forma que achei de assumir quem eu sou. Existe a pessoa para
quem eu crio, mas ela é um pouco fora do normal”, diz ele.
Sua nova coleção vai misturar figurino com vida
real. O desfile terá looks de pegada teatral -volumes grandes, tecidos
listrados quase decorativos e bordados com pedrarias- , mas modelagem mais
casual. Como o momento é de celebrar a marca, o público também vai ouvir um
texto de Gerald Thomas escrito a respeito do trabalho do estilista e com
leitura da atriz Vera Holtz.
Fernanda Yamamoto também transfere sua passarela
para fora da sala de desfiles. A marca vai mostrar a nova coleção no edifício
Virgínia, um prédio na região central de São Paulo com aspecto de ruína que tem
recebido exposições de arte e design às vésperas de passar por um retrofit.
A nova temporada, afirma a estilista, tem roupas
elaboradas para amigos, clientes e colaboradores da marca, pensadas
individualmente, de acordo com a identidade e o gosto de cada um. Isto
significa que não há um tema central.
Ao todo, 22 mulheres e oito homens, de diferentes
idades, raças e tipos de corpo, mostrarão looks com elementos característicos
da marca, como plissados, quadradinhos e bordados. “É uma roupa especial,
mas é uma roupa usável”, diz Yamamoto.
Borges, da SPFW, destaca a importância da moda para
a geração de riqueza no país. Ele menciona um estudo divulgado há pouco pelo
Observatório do Itaú Cultural que constatou que a economia criativa como um
todo -incluindo a moda- foi responsável por 3,11% do PIB brasileiro em 2020.
Naquele ano de pandemia, a porcentagem foi superior à da indústria
automobilística.
A moda é o quarto setor que mais contribui nestes
3,11%, depois de tecnologia da informação, arquitetura e publicidade, afirma
Jader Rosa, gerente do Observatório do Itaú Cultural. No mais, de um total de
130 mil empresas na indústria criativa, 50 mil são de moda.
Mas os números expressivos não dão conta da
complexidade da situação. Segundo outro estudo, também do Itaú Cultural, o
mercado para os criativos que trabalham com moda encolheu 17% entre 2021 e
2022. Cerca de 123 mil postos de trabalho foram perdidos. “No caso da
moda, há uma grande fragilidade setorial, com a informalidade ficando em torno
de 75%”, informa a pesquisa.
Rosa trabalha com a hipótese de que os números
negativos resultam do quanto a indústria fashion foi afetada durante a pandemia
e, em seguida, pela Guerra da Ucrânia, fatores que desencadearam uma crise de
insumos global e prejudicaram a empregabilidade e a produção no Brasil.
Intitulada “Origens/Ressignificar”, a São
Paulo Fashion Week também se debruça sobre outras questões a ocuparem a cabeça
dos fashionistas, entre elas a busca por novos tecidos, mais sustentáveis, como
o algodão feito com menos agrotóxico e as fibras criadas tendo como base frutas
e sementes brasileiras. A marca TA Studio, para citar um caso, traz para a
passarela aviamentos com fios feitos a partir da manga.
Além disso, depois de instituir em 2020 a
obrigatoriedade de que metade do elenco de cada desfile seja de negros,
afrodescendentes ou indígenas, a semana de moda quer ir além das pautas
identitárias, reconhecendo a potência de cada indivíduo. “A gente quer
tratar o conceito de que eu posso sentar numa mesa e eu não vou mais falar
assim -aquela é preta, aquele é indígena, aquela é trans. Eu tenho que falar
com você”, diz Borges.
55ª SÃO PAULO FASHION WEEK – ORIGENS/RESSIGNIFICAR
Quando De 22 a 28 de maio
Onde Shopping Iguatemi, Senac Lapa Faustolo,
Komplexo Tempo e outros locais de São Paulo
Preço A partir de R$ 180; ingressos esgotados