Navegando pelas memórias de Mestres da Cultura Popular

Written by on 24 de novembro de 2022

O futuro é ancestral. É
preciso refazer os passos dos que vieram antes, conhecer a história do seu
próprio lugar, saber onde tudo começou e quem guarda a raiz da nossa
identidade, para que com nossos braços possamos proteger essas memórias e com
nossas pernas criar novos caminhos.

O
projeto “Entre Rios e Memórias – A Cultura Popular de Marabá” nasce deste
desejo de salvaguardar a memória e história de cinco Mestres e Mestra da
Cultura popular de Marabá. São eles: Zé do Boi (Boi Bumbá), Dona Zefinha
(Benzedeira), Seu Chengo (Pescador), Seu Sérgio (Artesão Naval) e Seu Manoel
(Divino Espírito Santo).   

Maior festival de Carimbó está de volta em Marapanim

Idealizado
pela Produtora Cultural Clara Morbach e pelo Artista Visual e Designer Livando
Malcher, o projeto, contemplado com a nota máxima pelo edital de Arte e Cultura
da Fundação Cultural de Pará, registrou, por meio de cinco curta metragens, a
oralidade e saberes destes mestres considerados patrimônio imaterial do Sudeste
do Estado.

“O
projeto nasceu de um interesse antigo meu de registrar a memória de Mestres e
Mestras detentores de saberes tradicionais e da cultura popular daqui de Marabá.
É uma relação que eu já venho construindo há alguns anos, principalmente no
bairro do Cabelo Seco, e essa relação foi se aprofundando e desse desejo antigo
surgiu a oportunidade de materializar o projeto por meio do Edital de Arte e Cultura
do FCP junto da parceria do Livando Malcher do Estúdio Ingá”, conta Clara
Morbach.

Documentários destacam Mestres da Cultura Popular de Marabá

Ainda
de acordo com a Produtora Cultural, a escolha da linguagem audiovisual se
mostrou um meio interessante de compartilhar a memória dos Mestres com o maior
número de pessoas. “A gente imaginou que o audiovisual seria uma forma de
manter e expandir a transmissão destes saberes, de dar a oportunidade de se
contar estas histórias para que elas alcancem a juventude, para que a juventude
saiba a história do seu lugar e território, e quem são aqueles que guardam a
nossa identidade. É uma forma de reconhecer a importância destas pessoas,
destes Mestres”, resume.

Memórias de Boi Bumbá

José
tinha oito anos de idade quando brincou de boi pela primeira vez. As memórias
daquela única experiência não só o acompanharam por toda a vida, como também o
conduziram para o que se tornou a missão dele: “Eu lembrava as melodias, as
façanhas que tem o boi, o drama do boi em si, e aí fica na cabeça da gente,
principalmente criança fica a marca. Eu fiquei com esse negócio até os 40 anos,
até que eu encontrei uns parceiros no meu aniversário, eles comentando, bora
fazer um boi? Vamos”.

Assim nasceu o Boi Bumbá Flor
do Campo e também o Mestre Zé do Boi, nome pelo qual José Rodrigues da Silva é
conhecido em Marabá. Dos seus 72 anos de idade, 32 foram e são dedicados para a
tradição do Boi Bumbá. “Eu sou apaixonado pelo Boi. Pra não deixar a cultura
morrer eu mantenho isso aqui e meu apoio é essa juventude que tá me acompanhando.
Quero deixar tudo pra eles, pra eles falarem, foi o Zé do Boi que deixou”,
resume.

Mãos de Cura

 











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Foi em um casebre de alvenaria
em frente ao Rio Tocantins, no bairro de Francisco Coelho, que Dona Zefinha
nasceu, se criou e recebeu da mãe dela, dona Maria Pretinha, o ofício da cura,
tornando-se Benzedeira. “Eu aprendi tudo com a minha mãe. A minha mãe era
benzedeira, daí ela passou pra todas as minhas irmãs. De tudo eu sei benzer: cobreiro,
quebranto, peito aberto, mal olhado. Tudo que ela me ensinou eu aprendi e faço
isso na minha cidade”, conta.

Mestra nas Artes da Cura, Dona
Zefinha é muito procurada para cuidar de casos que a medicina moderna não
consegue resolver: “Quando tem gente com cobreiro no hospital, a doença do
cobreiro é pesada, e nesse dia mandaram me chamar…eu vou, não nego, eu sei
que lá tem os médicos, mas é como eles dizem, ‘nós somos médicos, mas você é
outra doutora’”.

A terceira margem

 











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Da outra margem do rio,
sentado em sua canoa, o pescador Raimundo Coelho de Souza viu a cidade de
Marabá se expandir e desenvolver. Viu também amigos partirem, crianças
crescerem e o coração dele se encher de memórias que vão e vem como maresia.

“Aqui quando eu era menino
isso aqui tinha uns mato que a gente chama rabo de raposa. Aí a gente ficava
pescando, brincando aqui dentro daqueles rabos de raposa. Isso aqui não era
orla, todo prefeito que entrava dizia que ia fazer um cais e nunca fazia, só
mais recentemente fizeram a orla e o cais”, lembra.

Nascido e criado no bairro do
Cabelo Seco, o pescador, mais conhecido como Seu Chengo aprendeu a arte da
pesca com o pai, Seu Dito. Hoje, aos 77 anos, ele segue a vida entre o rio e o
cais nesta orla de tantas lembranças. “Pra nós é muito importante esse rio
aqui, é um tesouro. Porque ele tem tudo, muitas espécies de peixes aqui, é
pouca espécie que não tem, a maioria tem aqui. Aqui a gente se banha quando tá
inverno ou verão, banha no rio mesmo. A maioria do pessoal faz questão de estar
aqui, no rio”, conta.

Nome que corre nos rios

 











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Mestre Sérgio ancorou em
vários portos antes de escolher Marabá como o próprio cais. Nascido em 1953 na
comunidade de Carapajó, no município de Cametá, conheceu o ofício de Artesão
Naval ainda na adolescência. “Comecei na média dos 14 a 15 anos. Naquela época
todo mundo começava a trabalhar cedo, arrumar uma profissão, e eu já tinha um
começo na minha cidade, porque em Cametá tem estaleiro grande, construção de
barco de todo tipo”, lembra.

Em Marabá, Sérgio aprendeu
mais sobre o ofício, convivendo com Mestres da Região. Ele participou da
construção de embarcações de transporte de castanha, até se especializar em um
segmento específico. “Chegou o tempo de eu trabalhar por conta própria e eu fui
desenvolvendo outros tipos de embarcação, quer dizer, começou a modificar meu
estilo, era mais embarcação com destino de lazer, pro povo curtir férias. Hoje
o meu nome está rolando no mundo, nas embarcações que eu construí”, afirma.

Fé e Folia

 











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Manoel puxa um andor que
atravessou Estados e também séculos. Nascido em 1939 em Marabá, ele é o quinto
Imperador da Festa do Divino Espírito Santo do Bairro de Santa Rosa e leva
adiante junto com a Esposa dele, Dona Lúcia, uma tradição trazida pelos pais dele
para a região.

“Meus pais, José Duarte da
Costa e Barcelise Tomás Dias foram coordenadores deste festejo desde antes de
eu nascer e através do padrinho do meu pai ele veio de Minas Gerais e começaram
a festejar em um lugar chamado cabeludo, que hoje é a vila Divino Espírito
Santo. Eu nem lembro quando começou porque eles já faziam antes de vir pra
Marabá, só eu já tenho 83 anos, então tem muitos anos!”, conta.

A tradição passada dos pais
para o filho conta com o apoio de toda a família e comunidade do entorno para
se manter viva. Embora Manoel seja um dos grandes guardiões do Divino Espírito
Santo de Marabá, com a generosidade de um Mestre ele afirma: “Qualquer
personagem do Divino é subordinado ao Divino Espírito Santo. O Imperador é
coroado pelos foliões, então não somos donos. A gente vai ajudando e vai
crescendo, aí vem meus filhos que tudo ajuda, os sobrinhos, netos que tudo faz
parte do Divino pra ajudar”. 

Lançamento
Presencial e Virtual

A
Mostra “Entre Rios e Memórias – A Cultura Popular de Marabá” acontecerá no
próximo domingo, dia 27, às 18h, no Cine Marrocos. Além da exibição dos cinco
curtas metragens que integram o projeto, o evento conta também com a
apresentação do Boi Bumbá Flor do Campo e com o lançamento do site do projeto,
onde os documentários serão disponibilizados gratuitamente.   (www.entreriosememorias.com.br)

Serviço:
Mostra “Entre Rios e Memórias – A Cultura Popular de Marabá”.

Dia:
Domingo, 27.

Hora:
18h.

Local:
Cine Marrocos (Travessa Lauro Sodré, 228, Velha Marabá)

Entrada
Franca.


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