Ananindeua: empresa fantasma recebeu mais de R$ 8,6 milhões

Written by on 12 de abril de 2025

Mais de R$ 8,6 milhões já foram pagos, entre 2021 e 2025, pela Prefeitura de Ananindeua, à uma empresa que seria de fachada: a Socorro Construções e Serviços Ltda, segundo números do portal municipal da Transparência. Os contratos são pelo aluguel de máquinas e veículos pesados, para a conservação de ruas da cidade.

E vão se somar ao contrato de R$ 12 milhões que ela assinou com a Prefeitura, no último 28 de março, para o aluguel de 25 caminhões e 5 microtratores, para a coleta de lixo da cidade. A Socorro Construções funciona em uma residência de 108 metros quadrados, sem placa indicativa de um estabelecimento comercial. Ela não possui nem sequer um carro de passeio e nem filial ou outro espaço, para abrigar a frota que aluga, dizem os documentos que registrou na Junta Comercial do Pará (Jucepa).

Segundo o advogado Ewerton Almeida Ferreira, especialista em Direito Administrativo, a falta de sede com uma estrutura mínima “é um sinal clássico de empresas fantasmas, comumente utilizadas em esquemas de contratação fraudulenta”. Nesta semana, ele protocolou denúncia no Ministério Público do Pará (MPPA), Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (TCMPA) e Diretoria Estadual de Combate à Corrupção (Decor), da Polícia Civil, pedindo que investiguem esse contrato de R$ 12 milhões, para o aluguel de caminhões e microtratores.

Como você leu no DIÁRIO, há fortes indícios de que esses veículos pertencem, na verdade, à Norte Ambiental Gestão e Serviços, cujo proprietário, o empresário Cleiton Teodoro da Fonseca, é amigo do prefeito Daniel Santos. Na campanha eleitoral do ano passado, o prefeito chegou a ser flagrado usando um avião da empresa, para viagens pelo interior do Pará.

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Há cerca de duas semanas, o próprio dono da Socorro Construções, Francisco Israel da Silva, admitiu ao repórter Paulo Cidadão, da TV RBA, que alugou esses 25 caminhões e 5 microtratores de uma empresa, para realugá-los à Prefeitura, mas negou que se trate da Norte Ambiental. No entanto, o DIÁRIO obteve fotos de vários caminhões de lixo estacionados no terreno da Norte Ambiental, no município de Marituba, alguns já até adesivados com a logomarca da Prefeitura de Ananindeua.

Vários deles foram flagrados efetuando a coleta de lixo da cidade. Todos estão registrados em nome de uma filial da Norte Ambiental, na cidade de Sorocaba, no estado de São Paulo. Um deles, de placa TJB5B78, até circulava em Ananindeua, nesta semana, com uma folha de papel ofício colada na porta do motorista, na qual se lia: “A serviço da empresa Socorro Ltda”.

Ilegalidades

A Socorro Construções funciona em uma casa térrea, na Vila Soares, passagem Santo Antonio, no bairro do Coqueiro, em Ananindeua, que é também a residência do dono da empresa, Francisco Israel da Silva, e sede de uma pequena empresa de Engenharia, além de já ter abrigado pelo menos três outras empresas.

Ao final de um ano, cada um dos 25 caminhões de lixo que ela alugou à Prefeitura terá custado R$ 443.280,00 aos cofres públicos, praticamente o preço de um novo. A contratação da empresa foi realizada através de uma dispensa de licitação ilegal e com indícios de “direcionamento”, ou seja, a intenção de beneficiá-la, diz o advogado Ewerton Almeida.

Segundo ele, a Socorro Construções não comprovou nem mesmo qualificação técnica: “experiência anterior, estrutura operacional, equipe qualificada ou aptidão para a execução desse tipo de serviço”. E em todos os órgãos públicos não há registro de que a sua atividade inclua o aluguel de caminhões de lixo com motoristas, como exigia a dispensa licitatória.

Além disso, há as características de “empresa fantasma” que a Socorro Construções possuiria, “sem qualquer estrutura operacional visível, fachada comercial, identificação de frota ou movimentação compatível com a execução de serviços de grande porte, como coleta de resíduos sólidos, locação de máquinas pesadas e operação de limpeza urbana”. O fato de a Prefeitura ter contratado a empresa mesmo assim, representa um “forte indício de direcionamento”, diz ele.

Outro indício, seria a própria “emergência” que a Prefeitura alegou, para a dispensa licitatória. Tudo começou quando a Prefeitura tentou realizar, neste ano, uma licitação de R$ 180 milhões para a coleta do lixo. O que representaria R$ 100 milhões a mais do que os contratos da Recicle e Terraplena, que hoje executam o serviço.

Mas a licitação acabou revogava três vezes, devido a irregularidades. Com isso, a Prefeitura alegou uma “emergência”, para contratar esses caminhões e microtratores sem licitação. Mas, explica o advogado, falhas em processos licitatórios não se enquadram nas emergências previstas pela legislação, já que não são causadas por fatores externos, imprevisíveis e inevitáveis. Além disso, observa, não há qualquer documento que comprove a “emergência” e risco à saúde pública alegada pela Prefeitura: não há nem mesmo um decreto do prefeito.

Prefeitura pode estar cometendo uma série de crimes

O advogado Ewerton Almeida também denunciou ao MPPA, TCMPA e Decor o fato de a Norte Ambiental vir realizando a coleta do lixo em Ananindeua, sem licitação ou contrato. Na denúncia, ele cita as reportagens do DIÁRIO sobre o caso e os indícios de que a Prefeitura vem tentando beneficiar a empresa do amigo do prefeito Daniel Santos.

Primeiro, com a licitação de R$ 180 milhões, para entregar a maior parte da coleta do lixo à Norte Ambiental, que até começou a realizar o serviço antes mesmo do resultado do certame. E agora, com o aluguel de caminhões dela, através de uma triangulação com uma empresa, aparentemente, fantasma.

Segundo o advogado, as irregularidades, tanto da execução da coleta de lixo sem contrato pela Norte Ambiental, quanto da contratação ilegal da Socorro Construções, podem configurar improbidade administrativa e crimes contra as licitações, cujas penas, somadas, podem chegar a 19 anos de prisão.

Máquinas pesadas

Parte do dinheiro já pago à Socorro Construções é de um contrato de 2019. Naquele ano, ela recebeu apenas R$ 412.729,51, diz o portal da Transparência. Mas na administração do prefeito Daniel Santos, esses ganhos deram um salto: foram R$ 1,086 milhão, em 2021; R$ 1,811 milhão, em 2022; R$ 1,8 milhão, em 2023; e R$ 1,877 milhão, em 2024.

Além disso, a empresa também assinou outro contrato com a Prefeitura, em julho de 2024, que lhe rendeu mais de R$ 178 mil naquele ano, e mais de R$ 1,878 milhão, agora em 2025, até o último 4 de abril. Esse novo contrato é em consórcio com a Perene Soluções Sustentáveis, para o aluguel de 59 máquinas e veículos pesados, para a manutenção de ruas.

A ata da licitação que originou esse novo contrato tem valor superior a R$ 18,5 milhões. Mas o contrato assinado com a Sesan, a secretaria municipal de Saneamento, ficou, até agora, em R$ 9 milhões. Ele foi assinado pelo então secretário de Saneamento, Paulo Roberto Cavalleiro de Macedo, depois afastado do cargo, por ordem judicial, por suspeita de envolvimento com uma quadrilha que fraudou mais de R$ 100 milhões em licitações.

Um fato curioso é que o DIÁRIO localizou um contrato entre a Socorro Construções e a Prefeitura, datado de abril de 2018, no valor de apenas R$ 75 mil. Ele está assinado por Lúcia Germano da Silva, esposa do atual dono da empresa, Francisco Israel. E o que a empresa fornecia à Prefeitura era apenas ferramentas, materiais elétricos, produtos de higiene e limpeza, por exemplo, como se, na época, fosse apenas uma atacadista.


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