Alunos de Escola Estadual se destacam com boas notas no Enem
Written by Redação on 26 de janeiro de 2025
Desde 2018, quando teve início a iniciativa de registrar pela primeira vez as boas notas obtidas pelos alunos na redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), a professora de língua portuguesa e redação, Ione Franco, tem visto a escada da Escola Estadual Albanízia de Oliveira Lima ficar mais lotada a cada ano. O bom desempenho obtido por uma quantidade cada vez maior de alunos é consequência de um trabalho que envolve a dedicação de cada estudante, mas, sobretudo, a aplicação de um método desenvolvido e aprimorado ao longo de 25 anos de experiência em sala de aula.
A aplicação da metodologia desenvolvida pela professora Ione Franco e batizada de “Construção e Reconstrução do Texto” tem início quando é solicitado que os alunos façam um texto diante de um eixo temático elaborado por ela própria. É a partir deste texto inicial que a professora não apenas avalia como os estudantes estão escrevendo naquele momento, como também dá início ao trabalho de reconstrução. E ela reforça que, desde esse início, esse acompanhamento é feito de forma individualizada. “Eu tenho nove turmas, mas eu olho todos os textos, um a um. Depois, quando eu verifico isso, vou chamando individualmente cada aluno”, explica. “Eu penso que esse trabalho individualizado, de atendimento direto, olho no olho, não olhando o erro do aluno, mas sim as possibilidades de como ele pode evoluir no texto, é fundamental.”
Reforçando que não é possível considerar que todo mundo entende o processo de construção de uma redação da mesma maneira, a professora busca trabalhar essa habilidade nos alunos considerando suas particularidades, seus receios, suas emoções. Feito isso, é iniciado o trabalho de reescrita. “Depois disso, eu entro com o método. Aí, sim, eu tenho um método que vai fazer com que eles exercitem muitas vezes em um único texto, que é esse texto inicial que eu dei. Aí, a partir disso eu trabalho também com muita pesquisa a respeito do tema desse eixo temático porque eu percebo que falta informação, argumentos, repertórios e eu vou trabalhando isso um a um”, explica. “Eu não consigo trabalhar de uma maneira geral, a não ser que seja para explicar algumas conexões dos repertórios que eles usam com a problemática e isso é feito constantemente. Então, depois que eles entendem todo esse método, eles vão treinar várias vezes e verificar onde estão errando, os problemas e todos os aspectos linguísticos mesmo”.
Neste sentido, todo o trabalho parte do texto do próprio aluno. Não à toa, a professora aponta que nunca fez uso de nenhuma redação nota 1.000 para servir de base para os seus alunos. “Isso porque o texto nota 1.000 já está pronto, ele já tem uma nota, ele já tem um perfil do candidato que escreveu e o aluno que chega tem o próprio perfil, tem as próprias dificuldades e a evolução dele precisa ser observada. Então, o que serve de exemplo é o próprio texto do aluno, não é nenhum texto que tenha tirado nota 1.000”.
Outro ponto fundamental na metodologia é o incentivo à pesquisa por parte dos alunos. É o que possibilita que eles tenham maior repertório e maior capacidade argumentativa na hora de escrever uma redação. “A pesquisa é fundamental porque eles se descobrem já diferente do que eles eram porque eles passam a ter argumentos, a saber como defender as teses deles. Então, tudo é importante, mas não pode ser jogado de qualquer maneira, o atendimento individual é o que faz a diferença”, acredita a professora que é especialista em abordagem textual na área de linguística pela Universidade Federal do Pará (UFPA).
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Depois de aproximadamente seis meses trabalhando essas redações com os alunos, Ione costuma aplicar uma prova em meados de setembro ou outubro de cada ano para avaliar se realmente os alunos dominaram o método. Um diferencial do teste aplicado pela professora é que ele não apresenta um texto de apoio, como costuma ocorrer na prova do Enem. Com isso, os alunos são estimulados a usar como base o próprio repertório que eles vêm acumulando ao longo do ano com as pesquisas realizadas. “Quando eles vão fazer essa prova eles vão só com o tema, então, eles têm que já ter pesquisado, lido sobre o assunto. Eles têm uma informação mais ampliada do que resumida, que é o texto de apoio que o Enem dá. E se torna mais fácil quando eles chegam no Enem porque já está ali a informação sobre o que eles devem falar. A pesquisa é proposital porque, na medida em que eles pesquisam, eu vou observar se eles interpretaram corretamente o tema para poder conectar com aquilo que eles querem colocar no texto”.
A partir da avaliação da prova, a professora consegue identificar como está o entendimento dos alunos sobre o método e aprimorar alguns aspectos que ainda precisam ser melhorados na redação. Entre as principais dificuldades que ela observa entre os alunos ao longo de mais de duas décadas como professora, estão desde a dificuldade de argumentação, até a questão da grafia e de todos os aspectos do uso da língua, como concordância verbal e nominal, e a translineação.
Diante do trabalho de reescrita orientado e particularizado, porém, os alunos começam a superar essas dificuldades aos poucos. Entre os que conseguem apreender o método de forma mais eficiente, inclusive, a professora Ione seleciona alguns monitores que ajudarão a compartilhar o conhecimento com seus colegas. E o resultado de tudo isso vai muito além do bom desempenho nas redações escritas. “Eu aposto muito na capacidade do meu aluno, isso é um fato. Eu trabalho muito a autoestima deles, é preciso trabalhar para ele saber que ele é capaz, sim, ainda que no terceiro ano, de recuperar o que ele não sabia até aquele momento e aí vai depender muito também da força de vontade dele. Mas eles são bastante dedicados, na mesma intensidade que eu sou”, avalia Ione. “Eles se descobrem. Eu tenho, inclusive, alunas que fazem jornalismo por terem descoberto o prazer da escrita. Tenho alunas que são professoras de língua portuguesa, já trabalham na área e são encantadas pela língua portuguesa”.
Com o sentimento de dever cumprido sempre que, a cada novo ano, novos alunos ocupam os degraus da escadaria da escola para fazer a foto segurando as placas com suas pontuações na prova de redação, a professora Ione não tem dúvidas de que todo o esforço empregado ao longo do ano vale à pena. “Não é um trabalho fácil, mas eu faço questão porque o método fica muito particularizado. Eu lembro que eu recebi muitas propostas de pessoas querendo que eu vendesse o meu método, mas não é essa a intenção porque o método exige um grande envolvimento, uma dedicação imensa da minha parte de atender aluno para aluno, e aí eu me perguntava ‘será que esse professor para quem eu vou vender vai fazer a mesma coisa?’”, recorda. “E eu tenho certeza de que os professores são muito capazes de criar os seus métodos e fazer com que essas notas também nas outras escolas aumentem”.
A professora lembra, ainda, que o método não é fechado, mas está em constante aprimoramento. Na medida em que ela observa os resultados obtidos, ela busca perceber onde ainda não funcionou como ela queria e promove alterações e novas formas de trabalhar esses aspectos com os alunos. “Outra coisa também que é bem bacana falar é a liberdade e que a direção da escola me dá para que eu possa trabalhar do meu jeito, sem fugir, obviamente, daquilo que é estipulado pela instituição para ser trabalhado em sala de aula. Mas essa liberdade de como aplicar o meu método é plena e isso é muito bom, me deixa mais tranquila também”, conclui Ione Franco.
ENTENDA
Em meados de 2018 para 2019, a Escola Estadual Albanízia de Oliveira Lima teve a iniciativa de registrar as boas notas obtidas por seus alunos na redação do Enem. Sentados na escada da instituição de ensino, os estudantes com os melhores desempenhos foram fotografados segurando plaquinhas com as suas notas na redação. A comemoração traduzida em forma de foto chamou a atenção nas redes sociais e, desde então, a cada ano o gesto se repete, com um número cada vez maior de alunos ocupando os espaços da escada. O bom desempenho de um número cada vez maior de estudantes na redação ao longo dos anos também acabou chamando a atenção para a metodologia desenvolvida pela educadora responsável por lecionar a disciplina na escola, a professora Ione Franco.