Mônica faz 60 anos com comportamento modificado

Publicado em 2 de março de 2023

Em 3 de março de 1963, um Cebolinha meio
mal-educado tentava se equilibrar na sarjeta quando encontrou pela frente uma
menina com seu bichinho de pelúcia favorito. Mandou-a sair dali e, como
resposta à falta de jeito, ganhou uma coelhada na cabeça.

Foi assim que Mônica, líder da turma mais famosa do
Brasil, foi apresentada aos leitores, em sua primeira tirinha que nesta sexta
(3) completa 60 anos de existência. Muita coisa mudou de lá para cá. Por
exemplo: sua aparência ficou mais redonda, para ser animada com mais facilidade
pelos computadores, e ela hoje em dia já não bate em mais ninguém.

Sinal dos tempos, conta Mauricio de Sousa, o pai da
Mônica dos quadrinhos e da Mônica da vida real. Inspirado nos trejeitos e no
rostinho de sua filha, que na época tinha quase três anos de idade, ele
desenhou a menina que lhe daria fama e que faria tantas gerações de leitores
felizes.

Em uma entrevista exclusiva para a reportagem, ele
fala sobre como o processo de entender melhor o que é ofensivo, com a ajuda do
“politicamente correto”, ajustou o comportamento da Mônica, diz por
que acha que ela teve uma vida tão longa, e adianta o que a personagem pode
sonhar e correr atrás de ser quando crescer.

Aliás, está aí uma possibilidade, diz Mauricio.
Depois da Mônica Jovem, criada em 2008, a Mônica Adulta faz parte dos planos do
desenhista e de sua equipe. É aguardar para ver.

*

PERGUNTA – Como foi para você o nascimento da sua
filha Mônica? E como você escolheu o nome dela?

MAURICIO DE SOUSA – Mônica foi minha segunda filha.
Eu já tinha a Mariângela. Era um momento em minha vida de muita luta para
conseguir viver como desenhista. O nascimento de um filho é mágico, e sabia que
ela me daria forças para continuar a lutar pelos meus sonhos. Mais tarde vi que
ela sempre participou de meus sonhos.

O nome Mônica foi em homenagem à atriz italiana da
época, Monica Vitti. Eu adoro o cinema italiano dos anos 1960.

P – Ela tinha dois anos e meio quando você se
inspirou nela para criar sua primeira personagem menina. Por que desenhar sua
filha e não outra menina aleatória?

MS – Meus amigos da redação do jornal me
perguntaram por que não havia meninas nas historinhas do Cebolinha. E eu também
me perguntei isso. Como desenhava em casa, minhas filhinhas brincavam ao lado.
Olhei para elas e logo me inspirei no jeitinho delas.

A Magali comendo uma melancia enorme, a Mariângela
boazinha brincando em outro canto, e a Mônica, com um coelhão que eu dei para
ela correndo de um canto para outro. Então não criei nada. Estava tudo lá ao
meu lado. Surgiram então a Magali, a Maria Cebolinha e a Mônica.

P – Por que os dentes da Mônica são grandões?

MS – Quase toda criança tem os dentes da frente
maiores. Minha filha tinha também, digamos, mais do que o normal. Destaquei no
desenho. Depois as crianças crescem e isso fica em segundo plano.

P – Por que você achou legal dar um coelho de
pelúcia para a Mônica dos quadrinhos?

MS – Como disse, eu tinha dado de presente para a
Mônica um coelhão de palha amarelo, já naquele momento dos três aninhos. Então
só incorporei à personagem com ele um pouco menor. A cor azul foi para
contrastar melhor com o vestido vermelho.

P – A Mônica de verdade também só usava roupas
vermelhas? Por que você escolheu dar só vestidinhos iguais para a Mônica dos
quadrinhos?

MS – Minha filha sempre gostou de roupas vermelhas.
Aí apliquei na personagem. Personagem de quadrinhos sempre fica com a mesma
roupa para ser identificado.

P – E de onde vem a força da Mônica?

MS – Aí juntou o jeitinho dela de personalidade
forte, liderança natural e força mental para que passasse isso nas historinhas.
Funcionou muito bem.

P – Grandes meninas dos quadrinhos também fizeram
muito sucesso, como a Mafalda [personagem argentina de 1964] e a Luluzinha
[personagem americana de 1935], mas nenhuma delas chegou aos 60 anos com
tirinhas novas. A que você atribui essa vida longa da Mônica?

MS – Em primeiro lugar porque eu me inspirei em
alguém real. Depois porque comecei a montar uma equipe para poder produzir mais
e nunca perder a visão de que leitores querem bastante criatividade, sempre, e
a cada momento exigem mais. Acho que conseguimos isso nestes muitos anos de
vida do estúdio.

P – Ainda falando sobre Luluzinha e Mônica: as duas
sempre tiveram que lidar com meninos enxeridos. Como e por que você decidiu
colocar isso nas histórias da Mônica?

MS – Na infância são naturais as briguinhas e as
amizades mais próximas. Basta observar qualquer criança, mas em nossas
historinhas essas briguinhas são sempre resolvidas com a ideia de saber
conviver com as diferenças de cada um. Por isso sempre terminam como amigos
apesar das diferenças.

P – Você acha que hoje em dia a relação da Mônica
com os amigos meninos é diferente?

MS – A sociedade vai evoluindo e a discussão de
como vivemos também vai. Hoje temos o politicamente correto que nos diz o que é
uma ofensa e que antes passava batido. Estamos atentos a isso, e por esta razão
nas historinhas da turminha clássica a Mônica apenas roda o coelhinho, mas não
mais aparece batendo nos meninos.

P – Eles pararam ou vão parar de falar da aparência
dela?

MS – Sim, pela mesma razão.

P – Você modificou algo da Mônica ao longo desses
60 anos porque os leitores e a sociedade foram de certa forma pedindo?

MS – As modificações foram mais no visual porque
fomos adaptando a personagem às novas plataformas de comunicação nas animações,
por exemplo. Uma personagem mais arredondada facilita a animação em 3D. Na
personalidade não houve grandes mudanças. Amenizamos apenas para acompanhar as
mudanças comportamentais da sociedade.

P – As mães das meninas da Turma não tiveram uma
carreira além de dona de casa. Você acha que dá para a Mônica sonhar em ter uma
profissão e uma carreira?

MS – A Mônica e seu estilo de liderança inspira as
meninas para que se valorizem mais e tenham sonhos que possam realizar. Claro
que a Mônica adulta será assim. Na turma da Mônica Jovem já percebemos esta
evolução.

P – O que você acha que a Mônica quer ser quando
crescer?

MS – Qualquer profissão que exija força e
liderança. A minha filha real é nossa diretora comercial e está no lugar certo.
Acho que a Mônica personagem pode ir para o mesmo caminho. Vamos ver o que
poderá acontecer quando produzirmos a Mônica adulta. Está em nossos planos.

P – Como você acha que a Mônica inspirou e segue
inspirando outros desenhistas?

MS – Assim como me inspirei em desenhistas como
Will Eisner, do personagem Spirit, que depois virou meu amigo, todos
desenhistas precisam de inspiração em seus pares para crescerem.

Com nossa série de Graphics, onde passamos para
desenhistas brasileiros desenvolverem como seriam nossos personagens em seus
próprios estilos, podemos perceber, pelo sucesso da série, que a Turma da
Mônica inspira muitos deles até hoje.

 


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